7.10.08

Retrato de uma brasiliense.

Ela estava atrasada, como sempre. Vestiu a roupa correndo, engoliu uma fatia de pão às pressas e procurou a bolsa em meio à bagunça que estava em cima do sofá da sala. Apertou o botão do elevador no mínimo cinco vezes e vendo que alguém estava segurando no quarto andar, resolveu, muito irritada, descer de escada; morava no primeiro andar, mas descer 50 degraus de salto alto era o fim.
Na garagem, percebeu que alguém tinha arranhado o carro. “É meu dia de sorte!” pensou. Mas não tinha muito tempo para pensar, deixou o arranhado pra lá e entrou no carro. Passou por uma quadra, nada de engarrafamentos. Quando olhou bem à frente estava lá, a multidão de carros parados um atrás do outro, só esperando que ela se juntasse ao grupo.
No sinal, o menino que fazia malabarismo pediu um trocado. Do modo mais educado que conseguiu, disse: “sai menino, meu humor não está bom hoje”. E assim foi, lenta e irritadamente, até desaguar na Esplanada do Ministérios. “São seis faixas, não é possível que engarrafe”. Sempre pensava isso, mesmo sabendo que as seis faixas nunca eram suficientes para quantidade de gente que andava de carro em Brasília. Ela não entendia porque em cada carro havia apenas uma pessoa. “Se cada carro fosse ocupado por cinco pessoas, haveria menos da metade de veículos que estão aqui hoje”. Era uma coisa que a irritava, essa falta de compreensão das pessoas.
Passou pela Torre de TV e nem percebeu que o céu estava artisticamente pintado de nuvens. Aliás, nem sequer olhou para o jornal que o rapaz vendia. Na manchete, um assassinato na quadra onde morava. Ela não sabia e nem estava interessada em saber, só queria ter um tipo de carro com pneus gigantes para passar em cima de todos aqueles carros que estavam empacando seu caminho.
Enfim, chegou ao seu destino: Congresso Nacional. Uma hora de atraso. Uma bronca do chefe. Ela tinha cargo comissionado. Seu trabalho era apresentar o prédio aos turistas que queriam conhecer a capital do país. O primeiro grupo já estava esperando e ao passar envergonhada entre eles, ouviu uma conversa: “As pessoas de Brasília são tão frias, não costumam dar um simples bom dia!”. Sem dizer nada, contestou: “Esses turistas generalizam tudo. Nem todos brasilienses são tão arrogantes assim”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário