31.8.13

A Bahia.

Hotel Txai - Fotos: Jéssica Raphaela - http://instagram.com/jraphaela


Quando fui entrando na casa da dona Zélia, sem autorização, ela foi logo puxando a cadeira e oferecendo suco de graviola. "É feito de poupa da fruta",mostrou a sacola congelada guardada na geladeira. Falou da vida dela, os filhos moram em Salvador e ela vive sozinha em Arataca porque ama a cidade. "Mas a cidade ainda é a mesma de quando eu era criança. Nada evoluiu aqui. É uma vergonha", diz, indignada.

Eu descobri um mundo novo e bem curioso. E a verdade é que só queria pedir para usar o banheiro. Muitos baianos são assim, querem contato humano. "É bom quando vem gente de fora porque a gente sempre conversa as mesmas coisas com quem é daqui", desabafa Zélia. A pequena cidade estava mesmo cheia de gente de fora. Brasileiros de todos os cantos do país, canadenses, neozelandeses, franceses, suecos... A globalização de repente chegou ao município que nada evoluiu nos últimos 50 anos.

Enquanto andávamos a procura dos atletas (estava cobrindo a 10º edição do Ecomotion), um grupo de crianças e adolescentes começou a nos seguir. Achei a situação bem estranha. Sem acharmos o hotel em que a equipe Columbia Vidaraid estava descansando, viramos para uma das meninas que nos acompanhava sem convite e perguntamos onde ficava a pousada. Ela ficou estática, como se tivesse levado um susto estarrecedor. A sensação era que um personagem da novela das oito parasse de interpretar e falasse diretamente com ela. Muito estranho. Aquelas pessoas estão lá, abandonadas à vida pequena, e a qualquer contato com o mundo de fora, elas paralisam.

Eu estava cobrindo o evento para o caderno de esporte do Correio Braziliense. Foi minha primeira viagem como repórter e penso que não poderia ter tido uma oportunidade melhor. A corrida de aventura é um esporte que dá muita possibilidade de andar por lugares que você jamais iria por conta própria. Fomos, um grupo de jornalistas, num pequeno ônibus amarelo, pelo Sul da Bahia, de Itacaré a Ilha de Comandatuba (Una). Quando não estávamos no meio da mata e em cidades pequenas, ficávamos em um resort que ocupava quase a ilha inteira.

Antes de adentrar o paraíso, por uma balsa que atravessa o rio que separa o continente da ilha, no entanto, uma passagem pela pobreza. O hotel é um oasis em meio ao deserto. Entre os selecionados que podiam atravessar o rio, alguns trabalhadores. Mulheres fantasiadas de baiana com muito bom humor. É fácil encontrar a riqueza baiana.

Por falar nisso, a natureza é, sem dúvida, o maior bem do estado. Eu era a única calanga do grupo, sem praia no meu mundo, só eu pareci encantada com o litoral. E as árvores gigantescas, verdinhas.. no meio da floresta, flores. Achei tudo incrível. Fiquei feliz por ter conhecido esse pedaço de mundo e saber que ele existe.

Aliás, foi tão providencial essa viagem porque me fez vez que o mundo é grande, e é lindo. Estava bitolada com meu pequeno mundo, como se meus problemas fossem grandes. Não são. Grande é todo o resto que não conheço. Aquela floresta gigantesca que ao redor de mim enquanto caminhava 6km perdida entre uma caverna e um município. E as pessoas, todas que nunca me foram apresentadas - desde os atletas aos bêbados de Ilhéus (são muitos!). Foi um prazer me conhecer nelas!

Ilhéus
Ilha de Comandatuba, Una
Praia do Coroinha, Itacaré

Um comentário:

  1. Amei Jéssica, acho que representa também boa parte do meu sentimento nesses dias de cobertura. A cena da menina, sem entender o que falávamos, mexeu comigo profundamente. Foi um tapa na cara, um aviso que muitas vezes reclamamos de barriga cheia. Que o nosso país reúne uma desigualdade social inimaginável, que só conseguimos constatar a sua intensidade ao nos depararmos com um momento como esse batendo a nossa porta e nos convidando a pensar sobre uma coisa maior. Enfim, adorei a experiência e o companheirismo de todos vocês. Espero no ano que vem repetir a dose. Bj

    ResponderExcluir